Tradições de Páscoa no Centro de Portugal
Religião e Espiritualidade

Tradições de Páscoa no Centro de Portugal

Sendo Portugal um país predominantemente Católico, a época pascal reveste-se de um significado bastante profundo com diversas celebrações a acontecer em todas as regiões. E o Centro de Portugal não é excepção.  Da costa atlântica ao interior, nomeadamente em Ovar, no Fundão e em Idanha-a-Nova, os habitantes locais vivem esta altura do ano com enorme devoção e sentido de comunidade. Uma celebração repleta de rituais com sentido, de uma religiosidade enraizada e de tradições que perduram e cujas origens se perdem no tempo.

Ovar

A cidade de Ovar, perto de Aveiro, conhecida pelo seu rico património religioso e qualidade artística, celebra o calendário litúrgico, especialmente a Quaresma, com grande devoção há séculos.

No centro histórico da cidade, as tradições e devoções quaresmais contribuíram para um legado cultural único, especialmente através das procissões anuais da Quaresma, que são o ponto alto destas celebrações religiosas. 

A Quarta-feira de Cinzas marca o início da Quaresma, simbolizando a reflexão sobre a brevidade da vida e incentivando a renovação espiritual.

As Capelas da Paixão em Ovar

Originalmente construídas em madeira, as Capelas da Paixão foram reconstruídas entre 1748 e 1756 em pedra e cal, financiadas por um imposto sobre a venda de vinho. 

Actualmente, as sete capelas rococó do século XVIII formam um conjunto arquitetónico e artístico único em Portugal, retratando cenas da Paixão de Cristo com um design intrincado que combina arquitetura, pintura mural, escultura e talha dourada.

Todas as capelas situam-se no centro histórico:

  • Capela do Pretório (no interior da Igreja Matriz)
  • Capela da Queda (Rua Alexandre Herculano)
  • Capela do Encontro (Rua Alexandre Herculano)
  • Capela do Cireneu (Rua Cândido dos Reis)
  • Capela de Verónica (Praça da República)
  • Capela das Filhas de Jerusalém (Largo Mouzinho de Albuquerque)
  • Capela do Calvário (Largo dos Combatentes)

Procissões Quaresmais

Ovar acolhe várias procissões quaresmais de enorme significado:

  • Procissão dos Terceiros (Procissão das Cinzas) – organizada pela Ordem Terceira de São Francisco e pela Paróquia de São Cristóvão que sai da Igreja Matriz no dia 16 de Março às 15h00.
  • Procissão da Trasladação de Nossa Senhora das Dores – a imagem da Nossa Senhora das Dores da Capela do Calvário sairá para a Capela de Santo António, no dia 29 de março às 21h00, percorrendo as 14 Estações da Via Sacra.
  • Procissão da Paixão – recria o percurso de Cristo do Pretório até ao Calvário, incluindo o emocionante Sermão do Encontro entre Jesus e Maria, no dia 30 de março às 15h00.
  • Procissão do Ecce-Homo – também conhecida como "Procissão das Tochas". Apresenta três imagens do século XVIII (Crucificação, Cristo da Cana Verde e Cristo Atado à Coluna), transportadas em silêncio, com paragens nas Capelas da Paixão. Decorre no 17 de abril (Quinta-feira Santa) às 21h00.
  • Procissão da Via Sacra – organizada pela Ordem Franciscana Secular, percorre as 14 cruzes no centro da cidade. 18 de abril (Sexta-feira Santa) às 07h00.
  • Procissão do Enterro do Senhor – organizada pela Irmandade da Paixão de Cristo, p do calvario a procissão faz o percurso da Paixão de cristo com doi andores: o Cristo no Sepulcro e Nossa Senhora da Solidão. 18 de abril (Sexta-feira Santa) às 20h00.

As celebrações quaresmais em Ovar oferecem uma fusão notável de tradição, devoção e património artístico, tornando esta experiência cultural e religiosa única.

Fundão

O ciclo de tradições da Quaresma e Semana Santa no Fundão, nas imediações da Serra da Estrela, ainda hoje se assume como um acontecimento central do ano litúrgico cristão. 

Durante a Quaresma - período do ano litúrgico que antecede a Páscoa cristã, que se inicia na Quarta-feira de Cinzas e culmina na Solenidade de Domingo de Ramos, a Semana Santa - semana que antecede a Páscoa e a Páscoa - destacam-se em quase todas as pequenas aldeias do Fundão as “Encomendações das Almas”, os “Cânticos dos Martírios”, as “Ladainhas”: cantos piedosos e de meditação que tenham atravessado o tempo. 

São raros os lugares em que estes cânticos – uns com vozes masculinas, outros só com vozes femininas, não continuam a quebrar o silêncio da noite.

Em Lavacolhos, ocorre a singular “Procissão dos Penitentes”, reminiscência de velhos cultos pagãos, e na noite de Sexta-feira Santa, a Procissão do Enterro do Senhor, ainda se faz ao ritmo do choro de quatro mulheres, as Verónicas.

Na quinta-feira Santa, também no Fundão,  a Procissão do Senhor da Cana Verde sairá mais uma vez da Capela da Misericórdia e em todas as sete ermidas da cidade do Fundão o silêncio volta a estar presente na Paixão de Cristo.   

Na noite de sábado que antecede a Páscoa, todos os sinos do Fundão tocam em uníssono celebrando a Ressurreição de Jesus Cristo e a chegada da primavera, na “Festa da Aleluia”.

Em cada casa, em cada família, na época da Páscoa não podem faltar á mesa o bolo doce, o bolo de azeite, o cabrito no forno, ou o borreguinho com azeite, alho e alecrim, as papas de carolo e glorioso arroz doce.

Idanha-a-Nova

Em Idanha-a-Nova, na região de Castelo Branco, as tradições da Páscoa estão profundamente enraizadas e são gloriosamente celebradas.

Na noite de Sexta-feira Santa, realiza-se a Procissão do Enterro do Senhor, conduzida pelos irmãos da Santa Casa da Misericórdia. Carregando a imagem de Cristo, seguem até à Capela de São Jacinto, decorada com ramos de louro, jarros brancos, laranjas azedas e inúmeras cabeleiras, onde a imagem de Cristo é colocada num sepulcro. O silêncio solene é dramaticamente interrompido pelo vibrante bater da tampa do sepulcro, simbolizando o cair da enorme pedra que selou o túmulo de Jesus.

No Sábado Santo, a tradição de cantar "Alvíssaras" é acompanhada por pandeiretas e tambores de mão. Centenas de pessoas reúnem-se à noite na praça da igreja matriz de Idanha-a-Nova, soprando milhares de apitos que marcam a Missa da Vigília Pascal. E todos aguardam que o padre atire amêndoas para a multidão, uma tradição secular.

Em Segura, uma pequena aldeia a 34 minutos de Idanha-a-Nova, um prato especial é preparado para a refeição pascal: um puré de azedas servido com peixe do rio frito. O uso de ervas azedas faz referência simbólica à história do Êxodo, lembrando as ervas amargas consumidas pelos judeus na noite anterior à sua libertação do Egito.

Procissões Quaresmais de Idanha-a-Nova

Procissão dos Passos - 06 de Abril de 2025, às 19h
Ir Ver Nosso Senhor - 11 de Abril de 2025, das 18h às 20h
Preparação do Santo Sepulcro na Capela de São Jacinto da Igreja Matriz pelos Irmãos do Santíssimo - 18 de Abril de 2025, às 08h
Procissão do Enterro do Senhor e Sermão - 18 de Abril de 2025, às 18h30
Celebração eucarística com aparecimento da Aleluia e arruada pelas ruas da vila. Alvíssaras ao som dos adufes. O apanhar das amêndoas à porta do pároco - 19 de Abril às 21h 

Encomendação das almas na Aldeia Histórica de Monsanto

Esta é uma prática religiosa que ocorre às sextas-feiras da Quaresma, quando homens e mulheres sobem aos pontos mais altos da aldeia para cantar e rezar pelas almas do purgatório.

A Encomendação das Almas é um ritual associado ao culto dos mortos, praticado por mulheres durante a Quaresma, cujas origens remontam, provavelmente, ao século X. O objetivo da Encomendação das Almas é aliviar o castigo das almas no Purgatório ("Pregatório", na pronúncia local), através de orações, para que possam alcançar o descanso eterno. 

Este ritual é geralmente conduzido pelas "encomendadoras", mulheres que se reúnem em pontos estratégicos durante a noite e, através de cânticos e orações, chamam o resto da comunidade a despertar e acompanhá-las.

Esta manifestação resulta da fusão de rituais pagãos e cristãos, preservados ao longo dos séculos pela cultura popular. O uso de vestes negras está em sintonia com o luto, a compunção e a gravidade do tempo quaresmal. 

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